quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Cultura Paraibana Lava Roupa Suja


Texto elaborado, publicado no portal "Jornal do Capoeira", com base no Caderno Show e Variedades do "Jornal o Norte" edição de 25/01/2005.

Benedito dos Santos (Bené)

João Pessoa-PB

Fevereiro-2005

Há anos que "rola" na cidade de João Pessoa, uma polêmica com relação à produção cultural da cidade, desde que a Fundação Cultural de João Pessoa " FUNJOPE - assumiu os novos postos que a comunidade artística da capital vem discutindo sobre os projetos do Fundo Municipal de Cultura que ficaram pendentes desde 1997.

A artista Cátia de França foi o alvo principal das discussões, ela é acusada de utilizar de forma errada os recursos do seu projeto aprovado pelo Fundo Municipal de Cultura na ordem de nove mil reais.

Cátia de França, que no período de concessão dos benefícios passava por dificuldades financeiras, tipo água, luz, telefone e gêneros alimentícios.

O ex-diretor da Funjope Antônio Alcântara disse que a discussão sobre a artista é antiga e que o processo já saiu das instâncias da Funjope há mais de um ano, "se foi engavetado ou não isso está lá com a Procuradoria. Não é mais com competência da instituição", comentou o diretor que disse também que muitos artistas paraibanos não sabem trabalhar com as verbas que recebem e na sua gestão montou uma equipe para ajudá-los.

Amigos pessoais da cantora dizem que ela não fala com ninguém e que sente muito desgosto. O jornalista Ricardo Anísio, que também foi produtor da cantora no disco "Avatar", comenta que a discussão sobre Cátia passa pelo lado humano. "Ela utilizou o dinheiro para comer porque estava passando fome" disse. Na opinião de Ricardo Anísio, as pessoas que estão nos órgãos de cultura deveriam ser penalizadas por não apoiar uma obra que ela estava para musicar sobre o "ciclo da cana-de-açúcar" de autoria de José Lins do Rego. "Isso seria de maior interesse para os órgãos de cultura. Isso sim é um crime. Quem vai culpá-los por esse crime?" questionou.

O produtor cultural Chico Noronha e também amigo de Cátia de França considera as polêmicas injustas e cansativas. Para Noronha, a cantora não pode ser espelho para que muitos se sobressaiam às custas de opiniões infundadas de pessoas que não tem nenhum envolvimento com a arte de nosso Estado.

Sobre o desaparecimento do processo sobre o caso específico da cantora, o atual diretor da Funjope, Luiz Carlos Vasconcelos, explicou que o processo de Cátia de França havia sumido da Procuradoria Municipal e que há pouco surgiu da Secretária de Educação. "Um detalhe que vale a pena dizer é que agora não é o procurador sozinho que vai resolver o caso e sim a procuradoria que vai decidir os destinos judiciais de todos os artistas", comentou. A intenção do diretor não é prejudicar nenhum artista. Os diretores da instituição estão estudando uma forma de Cátia de França pagar o que deve a Funjope da melhor maneira possível, sem prejuízos para ninguém.

A idéia principal da nova gestão da Funjope é promover um Fórum Municipal de Cultura para que todas as questões sobre as leis, conselhos e fundos, além de criar uma forma de melhor fiscalizar os projetos e as ações, para que fatos desta natureza não voltem a acontecer. "Não queremos privilegiar ninguém. Cada caso será analisado com cuidado", acrescentou Luiz Carlos Vasconcelos.

É realmente lamentável que fatos como esses ganhem conotações desproporcionais aos valores que a artista Cátia de França, como profissional de cultura, está sendo tratada. Eu particularmente tive a oportunidade de acompanhar alguns ensaios de Cátia, conversar sobre cultura popular, ver seu engajamento em mostrar as raízes da sua terra natal e aí vêm fatos como esses. Lamentável! Chico Noronha tem razão quando considera injustas e infundadas certas opiniões de pessoas que nem do ramo cultural pertencem.

Vale salientar também que Cátia de França já foi agraciada com a "Medalha Augusto dos Anjos", em reconhecimento artístico por sua luta em defesa da cultura da região. Um outro ponto em favor de Cátia, em uma de suas últimas apresentações, no Projeto Seis e Meia, a mesma foi aplaudida de pé pela platéia assídua do projeto, projeto esse que envolve grandes nomes da música popular brasileira e é sempre precedido de uma atração local.

O Jornal do CAPOEIRA não toma partido, ficamos no aguardo de uma solução pacifica e torcemos que a integridade artística e humana de Cátia lhes sejam resguardadas, respeitem o silêncio de Mozart, os encantos da Elis, a magia de Cartola, Pixinguinha, Bezerra da Silva, Adoniran Barbosa, Lúpicinio Rodrigues, as verdades de mestre Pastinha, de mestre Bimba e de todos aqueles que em suas vidas mostraram, de forma clara e transparente, os nossos valores culturais. Reciclem suas "ignorâncias culturais" e pensem nisso, antes de atirarem suas pedras!

FONTE: adriana@jornalonorte.com.br e Cultura@jornalonorte.com.br

Texto enviado ao "Jornal do Capoeira" por Bené (PB). Bené é pesquisador de Cultura Popular da Paraíba, e integrante do Grupo Zumbi de Cultura Popular.

Divisão de Cultura Popular de João Pessoa - Parte final

Segue adiante a segunda parte da entrevista concedida pelo então diretor da Divisão de Cultura Popular da Prefeitura Municipal de João Pessoa, José Emilson Ribeiro, ao nosso pesquisador, Bené, em meados do ano de 2005. A entrevista foi publicada no portal "Jornal do Capoeira".



Por Benedito dos Santos (Bené) - Paraíba - Maio " 2005

Foto: Ivomar G. Pereira-Repórter - DRT 15855




JOCAP - Dando prosseguimento à nossa entrevista, perguntamos ao Sr. José Emilson: com relação aos herdeiros desses mestres que se foram, como está o interesse dessa juventude em seguir essa cultura deixada pelos seus pais?
José Emilson - "Há de convir companheiro, em tempos passados, nós tínhamos outra realidade em que, por exemplo, o Mestre do Babau, chegava em qualquer lugar e juntava um grande público. Esse grande público contribuía economicamente na sobrevivência dele. O cantador de viola, chegava em qualquer local, começava a botar a "violinha" para cantar, improvisar, e de repente, o recinto estava cheio. Eu alcancei isso ainda, na Feira do Oitizeiro, a quarenta anos atrás. Essa realidade é diferente. Atualmente isto só é possível de acontecer através de um trabalho de mídia, através da divulgação previamente preparada. Com isto se tornou difícil haver uma renda patrocinada pelos próprios ouvintes. Isso tem feito com que as pessoas não queiram mais continuar! Isso ficou bem claro, com relação aos herdeiros culturais do Mestre Martins Guedes, um dos maiores mestres de Mamulengo que nós tínhamos (não só do estado!). Hajavisto que, mesmo depois da sua morte, chegou convite para ele se apresentar em Brasília! Por conhecimentos que eles tinham da sua arte, muitos deles viviam em grandes dificuldades e só através do trabalho já desenvolvido pelo CPC, que conseguiu fazer uma rede de amigos, para apoiar a nossa cultura, é que tem dado para se apresentar em outros locais e ganhar algum cachê. Isso nos motivou para que reanimasse o trabalho. Acredito que acontecerá a mesma coisa com outros grupos de cultura daqui, a exemplo do "Boi-de-Reis" e do "Cavalo Marinho", aposta seu Emilson.

JOCAP - Seu Emilson, gostaria que o Sr. Nos falasse da Capoeira enquanto cultura na visão do CPC?
José Emilson - "Companheiro, com relação as capoeiras tenho diversos pontos a comentar. Antigamente dávamos atenção apenas à uma única capoeira, que era a capoeira Angola Palmares. Já hoje temos também a Capoeira Angola Comunidade desenvolvendo também trabalho. O presidente vinha para nossa diretoria e havia um certo ciúme de outras capoeiras locais, até que eles conseguiram passar por cima e nos procurar, e nós cedemos o espaço. Em quase todo evento que a CPC está promovendo - uma vez por mês - a Capoeira está presente. Ora ou outra, nos procuram com avidez de se apresentar; no último dia 26 de março próximo passado, nós tivemos a apresentação da Capoeira Madeira de Lei do Mestre Bambu, que ministra aulas em Recife e no bairro dos Novais através do instrutor Mola. Ficaram satisfeitíssimo por terem se apresentado no CPC, coisa que eles queriam a muito tempo. Outro exemplo é o trabalho belíssimo realizado pela Associação Cultural de Capoeira Badauê, e nós estamos querendo o retorno dela, com as suas danças Afro, pois aquilo marcou a memória e o povo fica perguntando "e aquele grupo de dança?". Sabemos que não é um grupo de dança, é um grupo de capoeira. Mas pensamos que todos os grupos de capoeira deveriam ter também estas manifestações, pois isso tem sido bom. Porque isso força as outras capoeiras a fazerem um trabalho melhor, diferenciar do corriqueiro e apresentar um trabalho mais esmerado. Infelizmente aconteceu do Zunga, da Afro Nagô, que se prontificou para se apresentar e na hora não apareceu por conta de outros problemas particulares deles. Mas, por outro lado, o contramestre Pantera, está esmerando se na execução de algumas particularidades da capoeira, porque você sabe que muitas coisas que a capoeira tem, o povo não vê! O Maculelê, a Orquestra de Berimbau, as Danças Afro, são fundamentais. A única coisa que precisa ser fundamental é a ginga. Mas o Samba Duro, o Samba de Roda, o Bate Coxa, são coisas que precisam ser levadas para o povo ver. Isto não acontecia até pouco tempo atrás. Um outro foco nesta questão são os eventos folclóricos. Sei que tem muita diferença, misturar folclórico com parafolclorico, apesar do mesmo termo, é um tempo tão pequeno que não dá para a pessoa apresentar suas particularidade. Por conta disso, aquele evento que nós fizemos "O que a capoeira tem que o povo não vê!", aquilo mexeu com muita gente(*). Inclusive tem muita gente aqui na FUNJOPE que viu pela primeira vez uma orquestra de berimbau, e se encantou!

(*) O Sr. José Emilson se refere a uma apresentação de dança Afro com a Associação Cultural de Capoeira Badauê, através do grupo Pérola Negra, sob a responsabilidade do contramestre Rafael Magnata.

JOCAP - Sr. Emilson, quais são as perspectivas e metas do CPC em desenvolver suas atividades, uma vez que o bairro dos Novais quer ramificar as atividades do CPC, como está idéia? José Emilson - "O CPC, desde o seu início, permitiu a criação de outros CPC"s em outros bairros. Em cada CPC significa um trabalho de garimpagem do que nós temos na nossa cultura. Alguém que vê nossa apresentação e lembra, "Ah!..meu tio falava muito numa ciranda que participou quando era jovem"; "tinha um tio que participou do boi-de-reis". E aí começamos a "cavacar" e as pessoas vem tentando trazer a tona aquilo que participou na sua juventude". Exemplifica seu Emilson.

JOCAP - Com esse resgate - queira ou não queira, um é o fortalecimento e o outro o resgate - dessa força que já existiu por aqui, podemos ter uma revolução da cultura popular, isso feito de uma maneira homogênea e bem ensaiada com a valorização dos seus artista, seus personagens principais?
José Emilson - "Eu acredito que pode acontecer, desde que, os agentes principais não fiquem de fora do planejamento, ou seja, que a Funjope, ao planejar o trabalho de difusão, vá atrás dessas pessoas mais interessadas. Ou seja, no caso do trabalho da capoeira, chame os mestres para discutir, para fazer apresentações. Se for um trabalho de salão, de academia, trazer os coronéis de quadrilha para discutir. É essa questão que estamos discutindo, eu e outras pessoas da Divisão de Cultura Popular. Temos procurado participar das reuniões das várias quadrilhas que nos procuram. Ficamos aqui um dia desses, horas, esperando uma reunião com a "Associação das Quadrilhas Juninas", mas infelizmente ninguém apareceu. Nós estamos abertos a ir na casa desse povo, e nas feiras de artesanato, seguir junto com os próprios artesãos. E quando for feito dessa forma, há uma tendência a explodir a nossa cultura popular em João Pessoa, mas não fazer isso que está fazendo. A minha Divisão está planejando para o mês de agosto próximo vindouro, um Festival de Folclore, onde nós não queremos trazer parafolclorico, mas somente folclórico e envolver todos os Estados vizinhos, no Festival Nordestino de Folclore". Promete seu Emilson.

JOCAP - Com relação a criação da Divisão de Cultura Popular, politicamente, podemos esperar uma ação permanente?
José Emilson - "Eu acredito que, uma vez atiçado a caixa de marimbondo, não vai se tranqüilizar. Uma vez que você esta na Capoeira, esteja participando do evento, se sinta satisfeito com aquele evento. Você pode cobrar depois que o governo passar, isso vai acontecer com a capoeira. Foi como surgiu o CPC, foi uma alternativa o que aconteceu com a ausência de uma estrutura estatal, uma estrutura estatizante, o CPC surgiu como uma alternativa. E creio que cumpriu seu papel, porque senão, não estaria aqui hoje. Senão, muitos grupos de cultura popular continuariam hoje no anonimato".

JOCAP - O sr. Poderia descrever o perfil do CPC desde sua criação?
José Emilson - "O Centro Popular de Cultura surgiu de uma certa revolta com algumas pessoas ligadas a cultura. Quando nós vimos um elemento na estirpe de um Joaquim Guedes, com todo o seu conhecimento sobre a arte, que é Arte dos Bonecos, pedindo esmola para sobreviver... outras vezes, encontrado caído e as pessoas pensavam que era embriaguez, levando-o ao hospital, diagnosticou-se tratar de inanição. Isso nos revoltou e levou o grupo a se reunir com os mestres e criar o CPC. Diga-se de passagem, não foi fácil, porque muitos mestres não acreditavam que pudesse existir alguma coisa com o CPC e ficaram na resistência. Só depois de várias reuniões é que foram se achegando e começaram a participar. Mas sempre participaram com uma pulga atrás da orelha. E não foram só os mestres, mas o próprio povo do bairro dos Novais se perguntava: "Por que essa festa? Algum interesse político existe por detrás". E era preciso que os organizadores chegassem no meio da festa e dissessem: "Se um dia eu for candidato, não vote em mim, aqui não tem política, a nossa política é a cultura". Então, esse trabalho de transformar, de criar uma vitrine, onde chegava o Babau para se apresentar, o Boi-de-Reis, aí fazia o chamamento do pessoal da universidade ligado a cultura e poucos iam. Mas os poucos que foram começaram a fazer um trabalho "boa-a-boca". Com relação à mídia, preferimos sempre manter distância. O nosso trabalho é divulgado boa-a-boca. E começaram a ser contratados esses grupos, como foi o caso da Orquestra de Berimbau que se apresentou durante toda a sua existência, uma única vez no espaço cultural, e nem por isso chamou a atenção. Mas a primeira vez que se apresentou no CPC, causou burburinho dentro dos setores culturais, ao ponto das pessoas ligarem ao CPC querendo contrata-lá. Outro exemplo, a ONG que esteve presente já tem evento programado para a orquestra de berimbau, já está planejado sua inclusão no Curto Circuito. Outro segmento da UFPB já nos ligou querendo a presença da orquestra de berimbau. Eentão, essa é a função do CPC, servir de vitrine. Recentemente, um grupo de dança do bairro, estava dando um depoimento público, dizendo que depois que se apresentou no CPC as portas se abriram pra eles, porque a primeira vez que se apresentou no CPC, tinha oito pessoas na sua escola, e na segunda vez que se apresentou já tinha quinze pessoas... Na terceira vez que foram convidados a se apresentarem em outro bairro, já com vinte e oito pessoas e hoje já são referência no bairro. Então eles não se cansam de dizer: "a pessoa que tiver o apoio direto do CPC, seria uma forma de abrir as portas para eles". Porque hoje, tem gente telefonando querendo que eles se apresentem". Finalizou o diretor da Divisão de Cultural Popular da Fundação Cultural de João Pessoa "FUNJOPE, José Emilson Ribeiro.

Fotos : 1ª - Boi de Reis (Mestre Pirralhinho ao Centro); 2ª. Mateu e Catirina

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Divisão de Cultura Popular de João Pessoa - Parte I

Matéria publicada por Benedito dos Santos (Bené) no site "Jornal do Capoeira" em 2005. Esta matéria, além de bastante aceita pelo público nacional pesquisador de cultura popular, serviu como texto explicativo em salas de aulas do sudeste do nosso paíssegundo editor do Jornal do Capoeira.



A Prefeitura Municipal de João Pessoa, por meio de sua Divisão de Cultura Popular, recebe o Jornal do Capoeira e fala do planejamento de valorização da cultura popular no município.




Por Benedito dos Santos (Bené) - Paraíba - Maio - 2005
Foto: Ivomar G. Pereira-Repórter - DRT 15855
Em entrevista exclusiva ao Jornal do capoeira, José Emilson Ribeiro, diretor da Divisão de Cultura Popular da Prefeitura Municipal de João Pessoa, através da Fundação Cultural de João Pessoa - FUNJOPE, fala da valorização da Cultura Popular pela Prefeitura Municipal de João Pessoa.


JOCAP - Qual a importância da criação de uma divisão de cultura popular na Paraíba, especificamente na cidade de João Pessoa?
José Emilson Ribeiro - "A criação de divisão de cultura popular tem uma importância muito grande, para que não aconteça como aconteceu nos governos anteriores, que se restringia toda atividade da Funjope aos grandes eventos, e pinçavam alguns grupos de cultura popular para se fazer presente, enquanto que hoje, nós procuramos dar uma ênfase maior a cultura popular e neste ponto, não estou sozinho aqui, haja vista, no que aconteceu com a realização da paixão de cristo, que fez uma série de inserções da cultura popular num evento sacro, considerado imexivel, então, com a divisão de cultura popular, há a oportunidade em se fazer a divulgação de grupos que antes não tinham oportunidade, trazer a tona, grupos populares de cultura de raiz, que antes, simplesmente passava desapercebido por parte dos grandes eventos, e a outra coisa é que tendo a pessoa ligada, nesse caso, eu, que venho a cinco anos fazendo a divulgação da cultura popular, já se colocou na ordem do dia, que seja dado aos grupos de cultura popular, tempo suficiente para que eles possam representar seu trabalho,então, o tempo muito exíguo. Exíguo que só dá prá fazer uma caricatura do que ele quer, trás de Pernambuco, por exemplo, o maracatu, dá quinze minutos para o maracatu se apresentar e não tem uma beleza em quinze minutos, o boi-de-reis, a mesma coisa. Então, a política. Digamos que estamos defendendo, maior espaço para que seja o trabalho mais bonito, trabalho mais convincente, que e a cultura!". Enfatizou o Diretor de Divisão de Cultura Popular da Funjope.


JOCAP - Como o Sr. Classificaria a questão da difusão da cultura popular da Paraíba hoje nos bairros?
José Emilson - "Acho que esse é o ponto principal, que a Funjope quer se apegar. O processo do curto circuito, que começou como experiência muito boa, mas que, nós estamos sentindo a necessidade de dar uma ampliação ao curto circuito, porque, você levar o curto circuito, com aquela quantidade de pessoas trabalhando em função de uma apresentação só, as vezes não dá ao público, o resultado esperado,então, estamos chegando a conclusão, que o curto circuito, deverá funcionar nos moldes do que vem funcionando o Centro Popular de Cultura, o CPC a cinco anos, ou seja, num só dia, numa só apresentação, fazer presente três, quatro, cinco grupos, no caso do curto circuito, eu defenderia a inclusão de três grupos, isso pelo seguinte. Muitas vezes, você já conhece aquilo que vai ser apresentado no curto circuito, e não se interessa muito, mas se vai ser apresentado três coisas diferentes no mesmo dia, as pessoas conhece uma, mas não conhece a outra, isso dá mais interesse e leva maior público para assistir. Não nos interessa gastar para fazer apresentação só para dizer que está fazendo, e tem um público muito resumido, o que interessa, é que o grande público, tenha acesso a isso, então seria, sair do centro e procurar os bairros, como por exemplo, já começou a presenciar isso aí, com a paixão de cristo. A Funjope disponibilizou o material que ela tinha prá vários grupos de teatro que quiseram encenar a paixão de cristo, e a mesma coisa nós vamos ter que fazer com relação aos outros segmentos da cultura popular, especificamente, com ênfase a nossa cultura de raiz"


JOCAP -
Sr. Emilson, a questão da cultura de raiz, você acredita que com a criação da Divisão de Cultura Popular, venha a se valorizar mais o artista popular, uma vez que a reclamação maior nesse sentido é que não se tem apoio para divulgar o trabalho realizado por esses artistas populares?
José Emilson - "Sem dúvida nenhuma, e nesse ponto, a gente está arquitetando algumas feiras de artesanato, e com relação a cultura de raiz, trazendo grupos, como por exemplo, foi apresentado no curto circuito, o maculelê, que é uma parte da capoeira, uma forma bem mais ampla do que nós tínhamos visto antes. Isso faz com que, não só os grupos sintam-se valorizados para procurar se apresentar. Nas pesquisas que foi feito em relação ao maculelê, apresentado na feirinha de tambau, através do curto circuito, onde apareceram vários personagens, que tem outras ilustrações e nunca foram apresentados; por exemplo; o vaqueiro; o feiticeiro e mais alguns personagens; inclusive, a apresentação do elemento fogo, que nunca tinha sido visto aqui em João Pessoa, foi apresentado através do maculelê".


JOCAP -
O Sr. Atribui como um resgate ou a revalorização da cultura?
José Emilson - "A revalorização da cultura"!- enfatiza "seu Emilson".


JOCAP -
Com relação a cultura popular na Paraíba e no resto do Brasil, o senhor poderia fazer uma análise nesse contexto cultural? O senhor vê a Paraíba isolada desse contexto, ou a cultura popular se sucede aos demais movimentos no país?
José Emilson - "Olha, o que eu posso dizer é o seguinte. A Paraíba é um dos estados mais ricos em cultura popular, isso a gente vê. Desde as pesquisas feitas por Mário de Andrade. Ele esteve em vários estados, e na Paraíba, ele visitou quatorze cidades, e nos outros estados, ele variava de três a quatro cidades, a paraíba foi o estado mais pesquisado por Mário de Andrade. Ainda hoje, apesar da grande concorrência da televisão. Por que uma coisa, é você estar sentado no seu sofá, assistindo até um parafolclorico pela TV, com toda comodidade, e a outra coisa, é você estar no campo, sujeito a chuva, poeira e também a adversidade do meio ambiente, como a gente vê. Então, a Paraíba é um dos estados mais ricos em cultura. João Pessoa, detém uma poção desses segmentos, mas eu defendo, mesmo com a TV, a gente não restringir a isso, mas que procure agir de uma forma a atrair pra cá, os grupos de cultura, a exemplo do CPC, apresentar grupos das cidades interioranas". Comentou.


JOCAP -
Sr. Emilson, nós que conhecemos bem a realidade do bairro dos Novais, onde existe a prática da capoeira , da ciranda, do coco-de-roda, do boi-de-reis e do cavalo marinho. Avaliando esse potencial do bairro, como o senhor classificaria os demais bairros de João Pessoa?
José Emilson - "nós temos cinco bairros em João Pessoa, esses bairros são celeiros em cultura popular, como Varadouro, Jaguaribe, Mandacaru, Torre e o bairro do Novais, eles são celeiros em cultura popular, e o bairro dos Novais está se projetando, por conta da criação de um organismo, que a gente resolveu em homenagem aos antigos Centros de Cultura Popular da UNE (União Nacional dos Estudantes), homenagear a UNE, combativa na época da ditadura, então criamos o CPC e esta entidade procurou servir de vitrine para os grupos que existiam, não só o bairro dos Novais, mas trazendo para apresentação, grupos de outras cidades, como por exemplo, a cidade de Cabedelo. Levamos a Nau Catarineta, trouxemos de Patos o parafolclorico, a Nau Catarineta é hoje também um parafolclorico, e trouxemos também, grupos de Bayeux, Conde e assim por diante, sem contar grupos vizinhos aqui da Paraíba. Hoje, o CPC se projetou por conta dessas atividades, que já se transformou em referência , se tornou referência ao ponto de um dia só de apresentação, que fazia todo mundo, não está sendo suficiente, porque por noite só dá para se apresentar três a quatro grupos. Nós entendemos que não se deve dá tempo insuficiente para cada grupo, não é possível se apresentar mais do que quatro grupos por noite e a concorrência de grupos que quer se apresentar no CPC é grande, ao ponto de dois dias estar se tornando pouco. Agora, isso para se ter uma produtividade, é necessário se repensar, porque chegou ao ponto que não é qualquer som que dá para se fazer uma apresentação. Haja visto, o que aconteceu na paixão de cristo, uma coisa triste, por não termos condições de contratar um trio elétrico, como sempre contratamos, mas a freqüência com a paixão de cristo na Sexta-feira, foi mais de cinco mil pessoas, ao ponto da Superintendência de Transportes e Transito da cidade de João Pessoa, não ter localizado nosso oficio e não ter ido dar cobertura. Os próprios motoristas, quando viam à distâncias, a multidão que estava na rua, eles desviavam, sem precisar da STTRANS, então fizemos a apresentação sem o apoio da STTRANS, só que a nossa apresentação foi tão (...) deixou tanto a desejar, que mais da metade das pessoas se retirou, não só pelo som, como pela dificuldade em presenciar as cenas por conta dos quatorze centímetros do nível do chão, sem ter um sistema de arquibancada, que fosse necessário para aquela quantidade de gente. Mas o bairro do Novais se transformou em referência por conta das atividades do CPC, uma entidade não governamental, sem interferência de políticos, só controlada exclusivamente pelos mestres que começaram. Mestre da Lapinha, da capoeira, do boi-de-reis, da ciranda, do cavalo marinho e mestre do Babau, são esses. O mestre do babau morreu, mas o folguedo continua na mão dos seus filhos, porque nós incentivamos os filhos a continuar o trabalho, e os outros mestres continuam dirigindo o CPC e dirigem de uma forma democrata, porque, até quem vai se apresentar ou não, quanto tempo para cada um, é decidido em reunião dos mestres, são eles que decidem". Explicou José Emilson Ribeiro.


Na próxima edição, publicaremos a parte final desta extraordinária entrevista concedida pelo diretor da Divisão de Cultura Popular da Prefeitura Municipal de João Pessoa, José Emilson Ribeiro.

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Apaga-se uma chama do Vulcão Cultural Paraibano

Crônica sobre o poeta paraibano Lúcio Lins que nos deixou no dia 16 de abril de 2005.
Por Benedito dos Santos (Bené)
Paraíba - Maio - 2005
Vítima de um câncer, único elemento que a muito custo acha que lhe venceu. Com essa vitória parcial dessa chaga, no dia 16 de abril de 2005, apagou se uma chama desse vulcão cultural paraibano, chamado Lucio Sergio Ferreira Lins - ou simplesmente Poeta Lúcio Lins.
Vamos conhecer um pouco do que foi Lúcio Lins. Nascido no dia 20 de fevereiro de 1948, na cidade de Philipéia - hoje João Pessoa. Autor de "Lado que Cavo/ que Covas" (1981-Ed. Alça de Mira) e "As Lãs da Insônia" (1982, Ed. Idéia). Era formado em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba da qual também era funcionário.
Lúcio Lins iniciou sua carreira publicando nos periódicos de João Pessoa em 1975, depois passou a contribuir com suplementos literários a exemplo de Correios das Artes, Suplemento de Minas, entre outros. Em 1982 foi vencedor do II Festival Norte-Nordeste da Música Popular Brasileira em parceria com Byaia, ganhando como a melhor Letra com a música Vôo Livre.
Integrou, nos anos 70, o Movimento Jaguaribe Carne juntamente com Pedro Osmar, Paulo Ró, Chico César, entre outros.
Tem parceria em músicas gravadas com Byaia, Fuba, no disco Esculamba e Chico César no seu último disco Beleza Mano, com o poema Duas Margens.
Confesso aos leitores do Jornal do Capoeira que me acovardei quando da inauguração da Casa de Cultura Lúcio Lins, em sua homenagem, os mesmo estava desfigurado de tanta emoção, vi na expressão daquela figura humana que desfigurava lentamente, brincando com a malvada da gente, deixando-a descontente, pois ele não queria deixar a gente. Lutou! Brigou! Esbravejou! Cuspiu na cara da morte bravamente! Tudo isso pela gente! Mas num dia diferente, ele desconte. Deu um tchau pra gente e foi embora contente! Deixando a morte na corrente!
Lúcio tinha a facilidade de formar redes de amigos, como é provado pelo leque de grandes nomes da música, da poesia, da imprensa, enfim, todos tinham a atenção de Lúcio. Simplesmente um grande poeta!
Vejamos a fala de alguns desses inesquecíveis amigos que Lúcio conquistou e preservou.
O professor, poeta e escritor Hildeberto Barbosa Filho compara a linha poética de Lúcio Lins ao estilo de Dorival Caymmy, "que é a presença do mar como grande metáfora da aventura poética, da própria viagem da vida. O mar como a grande metáfora da viagem", define, lembrando que esse ponto comum, ele observou logo no primeiro livro, "Lado que Cavo/que Covas" (1982) até o mais recente, "Perdidos Astrolábios".
Ele será um Caymmi que terá identificação musical com a cidade. Hildeberto Barbosa acha que com essa afinidade, Lúcio Lins se enquadra dentro do meio musical paraibano com as parcerias assinadas com Chico César, Eleonora Falconi, Adeildo Vieira, entre outros. Do amigo, Hildeberto Barbosa diz que ficou a imagem de um poeta inquieto que estava em toda parte e muito generoso. "Era o poeta mais representativo de sua geração. A obra dele é de qualidade. Ele e Sérgio de Castro Pinto são poetas de alto nível", considera, colocando Lúcio Lins como um irmão.
"Ele vinha à minha casa todo dia. Essa amizade foi uma das coisas mais importantes da minha vida. Com ele eu aprendi muito a lutar pela nossa cultura e arte em geral. Ele estava sempre procurando fazer algo pela cultura paraibana e ajudar os amigos", confessa Hildeberto, que deu a última prova de boa amizade no velório da São João Batista quando "vesti a roupa para colocá-lo no caixão".
O cantor e compositor Vital Farias lê a poesia de Lúcio Lins: "com visão da melhor qualidade. A poesia dele é muito poderosa. É um poeta que fala a verdade quando quer se expressar. Lúcio fazia uma poesia verdadeira, não tinha a mentira para querer aparecer tentando enganar e impressionar o leitor. Sua inspiração e seus inscritos revelam o grande poeta que foi. Ele foi o escultor das próprias palavras".
Mesmo afirmando que não gosta de comentar a vida de ninguém depois da morte, Vital Farias declara que Lúcio Lins é um poeta maduro de uma poesia milenar. "Não vou lamentar a morte dele porque não vale a pena. Ele vai permanecer vivo com a poesia que deixou. Conseguiu se imortalizar com sua obra", celebra.
"Poeta extraordinário": a definição é de Oliveira de Panelas. "Até nas conversas ele deixava a gente meditar sobre sua poesia quando falava de qualquer coisa. Ele demonstrava o seu lado poético até quando falava em política, futebol e outras coisas do cotidiano".
Para Oliveira de Panelas, a morte de Lúcio Lins deixa uma lacuna nas letras e nas artes paraibanas. "Ele vivia o dia-a-dia dessa cidade procurando sempre dar sua colaboração com sua arte de fazer poesia, o que ele sabia fazer muito bem", afirma.
O músico e compositor Escurinho conta que tem duas músicas prontas a partir de poemas de Lúcio Lins. "São trabalhos inéditos, mas não vou aproveitar essa oportunidade da morte dele. Quero deixar passar essa onda do falecimento para tomar uma decisão sobre o nosso trabalho". Afirmou Escurinho.
No dia 25 de fevereiro de 2005, foi inaugurada a casa da cultura Lúcio Lins, última homenagem em vida desse inesquecível Ser da literatura paraibana, onde amigos, a exemplo de Adeildo Vieira, músico e compositor, prefeito da cidade Ricardo Coutinho, Bebé de Natércio, Kennedy Costa, músico e parceiro de Lúcio Lins, Milton Dornellas, Fuba, músico e vereador da cidade, Erivan, músico e compositor, integrante do Grupo Tocaia, poeta Edonio Alves, Hildeberto Barbosa Filho, poeta, professor universitário e amigo pessoal de Lúcio Lins, como o defende um "irmão", Renata Arruda, cantora, Cristovam Tadeu, humorista, Ed Porto, poeta. Também estiveram presentes Wanderly Farias, organizador, Zezzita Mattos, poeta de diversas áreas do conhecimento manifestaram seu gestão de solidariedade e amizade a um poeta inquieto e produtivo, como era Lúcio Lins, que tive o prazer e a honra de ingerir algumas gotas do seu saber poético, obrigado, suas dicas me servirão de exemplo nessa trajetória literária.
Tenho a honra de publicar no Jornal do Capoeira, textos de uma agenda poética que me foi presenteada pelo mesmo, com o seu humor de irmão e camarada como sempre se dirigia a mim quando necessitava de alguma informação do trabalho que eu realizo e do qual ele era usuário.

Bené - Paraíba, Maio de 2005
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A Reforma (Lúcio Lins)
faço poemas
reformando a casa
sento cerâmica
no papel
e os pedreiros
sentam palavras
na sala
sou eu
que estou em silencio
são eles
que têm a fala
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História Flutuante (Lúcio Lins)
não tenho horizontes
tenho sonhos à vela
e a tempestade da história
não tenho mapas
tenho cartas anônimas
e os gritos de seus náufragos
não tenho mares
tenho a garganta seca
e as palavras navegáveis
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Memória das águas (Lúcio Lins)
Sei do mar
do seu sal
suas palavras naus
e toda paisagem
uma vista de Portugal
sei do mar
do seu longe
sua história mangue
e marulho nas ondas
uma linguagem lusitana
sei do mar
que o mar
ainda é um silêncio
e a palavra mar
um oceano de palavras
.......................
Duas Margens (Lúcio Lins)
Quando o tempo
me cobrir os céus
com a anágua suja
da tua espera
e teus lábios
forem duas margens
um
gritando calmaria
outro
clamando tempestade
eu voltarei
de corpo e barco
e por ti
seguirei minha viagem
navegarei
entre teus braços
e segredos
eu
serei teu búzio
tu
serás o meu degredo
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Cabo Branco ( Lúcio Lins)
extremo Cabo Branco
estranho trampolim
ao contemplar o Atlântico
o mar mergulha em mim
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Intervalo das Águas (Lúcio Lins)
Não parto:
Cedo-me a âncora
Feliz do mergulho
meu barco
deu-se ao intervalo das águas
e hoje eu nunca mais navegarei
hoje
me dirão nos arrecifes
pelas espumas das perdas
neste mar louco de pedras
meu barco
deu-se à ferrugem dos calados
e hoje eu nunca mais navegarei
não parto:
dou-me ao mar
.......................
Toque de Bola (Lúcio Lins)
O gol
divide a dor
o grito
no alambrado da boca
assiste a vida da geral
o futebol
dribla o Domingo
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Fim de Feira (Lúcio Lins )
as barracas se despindo
num arrumar-se de pano
igual um fechar de cortina
no fim de mais um drama
o lucro rouco e miúdo
insiste em mais um ato
no chão meio lama meio palco
que vive um cenário triste
já bem mais menos apressado
na calma dos baixos preços
no apreço dos gritos altos
o camelô fecha a mala
que mais leva do que traz
partido pra outro teatro
com um monólogo a mais
e cascas que outrora vivas
escorregam no seu liso
feirante piso de feira
fim de peça e de palco
que foi ponto de encontro
pra se viver um espetáculo
as cargas descarregadas
carregam-se menos que antes
e paras ensaiar novamente
vão-se em fila os feirantes
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Romaria (Lúcio Lins)
a rua
é uma procissão
profana
as preces
de ir aos céus
cada homem
é seu andor
dando volta na praça
eu
também alcancei
essa graça
.......................
FONTE:
Correio da Paraíba " caderno 2
Página C-1 edição de 19/04/2005
Jornal dos Municípios
Número 98 " edição abril/2005
Lúcio Lins (poética)
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Bené é pesquisador de Cultura Popular da Paraíba, e integrante do Grupo Zumbi de Cultura Popular